A rede devia ser alçada à categoria de patrimônio cultural material do sertanejo.
Não há tristeza, dor de cotovelo, espinhela caída, dor de trupicão, bucho inchado, esfraquecimento ou uma raiva da mulinga que não se esvaia com um cochilinho de meia hora numa rede.
O ideal é armá-la onde passe um vento encanado, perto de uma parede ao alcance do dedão do pé para dar impulso ao balancinho que vai ninar o sono perfeito. O toque põe esse bercinho dos deuses quase que em moto perpétuo e a gente entra em comunhão com a paz dos preguiçosos.
Uma rede cheirosinha acolhe e relaxa. Até mulher perto de parir acha conforto para a lordose. Melhor ainda, ela nem precisa de mãos alheias para atender aos ditames da bexiga sempre cheia. As varandas, preferencialmente de crochê tecido por uma avó, são a alavanca que dá autonomia. Conhecer essa felicidade devia ser artigo constante da declaração dos direitos das grávidas.
O balanço da rede não atrapalha nada. Dá pra ler, ver filmes, chorar, fumar escondido, batucar um notebook. A gente se deita e milagres acontecem: o côncavo que molda nossa coluna deixa também o nosso olhar pidão, viramos seres merecedores de cuidado. Notaram que todo mundo começa a balançar uma rede que tenha alguém dentro?
Os que tiveram a sorte de se aninhar numa delas, desde bebês, são os experts. Os bambas que sabem dormir com lençol e travesseiro, como se estivessem numa cama super hiper king. Uma rede é uma cama feita por deuses.
Ou serão elas mesmas as deusas do amor? Quem passou por todas as etapas de um namoro daqueles bem chegados, sente até o arrepio da lembrança e sabe do que eu falo. Pêndulo a favor do prazer.
Mas se algum desatento aparentado com o demo, com a cabeça no mundo dos idiotas, arma uma rede sem alinhar os cordões do punho, pode botar a perder toda a magia. Vejam o desmantelo da foto à esquerda. Punhos assim deixam a rede “pensa”, troncha, magoada, sem alma, com ânsia de desequilibrar quem ali se deite. O balanço vira labirintite.
Sangue sertanejo ferve quando vê um mal trato desses com seu patrimônio cultural. Quem não entende da arte de tirar deleite dele que se sente lá em cadeiras com design inimigo do repouso e deixe nossas redes em paz.