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Arrumando armários

Renato Ribeiro Coutinho foi um paraibano nascido pelos idos dos 1900. Não o conheci pessoalmente mas ele foi uma das figuras mais icônicas da minha infância e adolescência, em João Pessoa (1953-1970).
Dele, sempre soube muito pouco. Não sabia onde nasceu, se estudou ou o que estudou, se era simpático, generoso, feio ou bonito. Sabia apenas o essencial: era rico, morava numa casa de rico e era usineiro. Este último atributo, hoje é meio nebuloso devido ao meu desconhecimento da economia paraibana daqueles tempos. Mas, na época, usineiro para mim era uma espécie de Warren Buffet de hoje, um tycoon, um mega-blaster-rico. E ser filha dele podia significar a realização imediata de todos os sonhos. O mais importante deles era o de poder estudar, desde cedo, na Suíça ( ah, nossas tolas fantasias ☺ ), como sua simpática filha, alguém a quem conheci de leve, já na vida adulta. Até hoje não sei se a educação principesca era lenda, na João Pessoa de então, ou invenção da minha cabeça cheia de vontade de ganhar o mundo e aprender muitas coisas diferentes.

O fato é que este senhor, tão distante social e financeiramente de mim, transitou pela minha vida durante anos. E, aposto, que na de muitos pessoenses da minha geração.

Ele foi o personagem usado por muitas das famílias de classe média para incutir nos filhos o gosto pela parcimônia no consumo. Não por similaridade mas por oposição. Uma espécie de farol sempre sinalizando o que não estava ao alcance dos nossos orçamentos. A cada pedido por um sapato novo, uma bola de vôley de couro, discos, livros ou até mesmo pirulitos de moda, se recebia de volta, o lembrete de sempre: “Você pensa que é filha de Renato Ribeiro Coutinho?!!!”. E saíamos conscientes de que só se gasta quando se tem. Com um certo sentimento de culpa por pedir coisas que talvez nem precisássemos.

Hoje, arrumando meu armário de sessentona de classe média, eu me perguntei: ”Quando foi que comecei a achar que era filha de Renato Ribeiro Coutinho e pensei que podia comprar mais de 2 bolsas, ainda que nas liquidações?”

Hoje, vendo a sociedade discutir o consumo consciente e incentivar o minimalismo dos pertences, penso no papel importante, mesmo que enviesado, que Renato Ribeiro teve na minha vida. Um estranho símbolo que se perenizou e ainda me norteia.

Ah, o Google me disse, em 5 minutos, muito do que não soube dele em muitas décadas.

http://www.fgv.br/cpdoc/acervo/dicionarios/verbete-biografico/renato-ribeiro-coutinho

E, para surpresa minha, temos um sobrenome em comum. Numa leve recaída, fiquei pensando nos muitos sonhos de consumo que eu poderia ter realizado ☺ Por um minuto, me vi fazendo parte dessa turma da foto, do Collège du Léman, na Suíça. Mas só por um minuto. Não trocaria por nada a minha turma das Lourdinas.